segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Muito mais que figuras

O vício da observação ainda vai me levar à loucura. Ou, ao menos, tornar-me estranhamente íntima de uma realidade que não é a minha e que, por hora, tenho vago conhecimento. Pouco tempo depois de ter me mudado para a rua X (não me recordo quando, mas não faz muito tempo), reparei aquelas duas figuras. Figuras em todos os sentidos que essa palavra possa ter.
A minha visão limitada de mundo, comum à maioria das pessoas, que costuma ver exotismo em tudo, fez-me achar graça em miudezas de situações corriqueiras que, quando observadas com análise, tomam caráter peculiar. Não existe mal algum em uma avó morar com o neto, descerem e subirem ladeira juntos, irem ao supermercado e tudo o mais. Aquela, no entanto, não era uma simples dupla. Era engraçado e ao mesmo tempo agradável observar uma relação, à primeira vista, tão afável.
O garoto, branquelo e de finas pernas, tinha uma fronte de desculpa. Seu cabelo era em forma de cuia, um misto saudoso de John Lennon e Kurt Cobain. Talvez não só esteticamente esse mistura se dava. Ele tinha cara e pés de quem ouve rock – o All Star azul marinho (essa cor é característica) e as meias até as canelas não me deixam mentir. A aparência denunciava dezesseis anos, no máximo. Mas algo me fazia crer que esse adolescente, com cara de João, tinha uns vinte anos. Nas minhas subidas e descidas, eu ficava sempre atenta, na esperança de encontrá-lo, obviamente, na companhia da avó, carregando uma sacola de compras. Tinha uma cara meio nerd, mas ao mesmo tempo atraente. Nunca vou esquecer do dia em que o vi sem aqueles óculos horríveis: ele estava incrivelmente bonito (“lindo” seria mais poético, mas quero ser verossímil). Não lembro exatamente como, só sei que estava sem camisa, o que aparentemente não significa nada, já que – nesse quesito - estava mais para técnico de computadores do que para professor de física. Até hoje não consigo entender como aquele ser conseguia prender tanto o meu olhar. E era sempre ali que os encontrava, jamais em outro lugar. Quando eu sair daquela rua, o que mais será lembrado é certo.
Antes de relatar umas besteiras, normalidades interessantes apenas para cabeças como a minha, preciso destrinchar a figura da avó que, caso pudesse nomeá-la, Carmem seria a melhor opção. Baixinha, cabelo curtinho e grisalho, corpo robusto e estilo incomparável. Por isso, inclusive, quase não reparava o seu rosto. Apenas passava o olho em um conjunto típico e uniforme e logo deslocava a minha atenção para as suas roupas. Estas variavam muito, com dias de mulher de motoqueiro à hippie fã de Janis Joplin. Lembro vagamente (quero acreditar nisso!) que ela tinha uma tatuagem, parece que no braço ou no ombro, já gasta pelo tempo. Carmem manteve seu estilo verdadeiramente alternativo que, com certeza, carregou durante uma juventude de colocar inveja em muitos. Aparentava beirar (para mais ou menos) os sessenta anos.
A dupla era quase inseparável. Vez ou outra, encontrava João sozinho lavando um velho fusca amarelo claro. Essa carro, por sinal, era outro mistério. Parecia dividir o carinho do garoto apenas com Carmem. Já vi João lavando-o, limpando-o e até consertando o motor. Imagino que era um bem de família. Os dois, inclusive, já chegaram na porta do prédio juntos e à bordo desse mimo. Nada mais estiloso.
O que mais me intrigava era o contraste entre aqueles dois. O fato de vê-los sempre juntos e conversando alegremente fez-me pensar melhor em tudo isso. Eram uma senhora descolada e estilosa e um garoto franzino e dócil. Eles se completavam perfeitamente. Aposto que se os conhecesse, comprovaria todas as minhas teses. Tive a sorte de ouvir lapsos de conversas quando cruzava com eles. Confesso que ouvia mais a voz de Carmem. Certa vez, houve uma grande coincidência: quando sai do prédio, eles estavam na minha frente, seguindo a mesma direção que seria a minha. Apressei o passo e, quando estava logo atrás deles, recuei. Tudo para poder escutar a conversa e tentar descobrir um pouco daquele mundo. A surpresa foi enorme e, confesso, a felicidade também. Parte de minhas suspeitas confirmaram-se de maneira incrível. Carmem parecia indignada com algum fato. Não economizava “porras”, “puta-que-parius” e , quando fui obrigada a me distanciar, pude escutar um “é foda”. Já peguei-os rindo também. Engraçado é que Carmem era sempre muito falante e João atento, apenas escutando.
São meus vizinhos de um prédio ao lado. Neto e avó moram em um apartamento abaixo do nível do meu. Possuem uma espécie de área ao ar livre. Ali, pasmem, mandaram construir uma piscina. Não foram poucas as vezes em que pude ver João e Carmem cuidando dela, cobrindo-a para evitar sujeira. Aquela varanda, aliás, é um local que aparenta ser agradável aos dois. Outro dia, uma festa rolava por ali. Pude ver mesas e cadeiras apertadas no pequeno espaço. O som mecânico vinha de um vitrola, de onde saiam músicas de Elis Regina e Legião Urbana. Nossa! Eles usam vitrola! De fato, Dona Carmem deve mandar João ir à merda se ele disser que prefere usar um laptop. Quando voltei do meu afazer, bisbilhotei João tocando violão em uma rodinha de poucas pessoas. "Vovó", é claro, estava entre elas. Ele tocava Beatles; “Help!”, precisamente.
Não faltava mais nada, apenas coragem e idéias para conhecê-los melhor.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Madonna no Brasil


Achei que a passagem de Madonna pelo Brasil seria mais alardeada. A venda de ingressos, que parecia uma compra por um lugar ao sol, foi mais bem coberta que os shows em si. Sinto falta de uma descrição mais detalhada, música por música, além - é claro - de uma exibiçãozinha de nada na tv. Fui uma das que tentou e não conseguiu ingresso e que, diante de algumas notícias, tem a sua frustração em estado crescente. Matéria de A Tarde aborda que cambistas vendiam ingressos comprados a R$250 por R$100.


Através da notícia, tem-se a impressão de que o furação não está causando tanto estrago. Depois de uma estréia bem-sucedida, porém debaixo de chuva torrencial, o segundo dia de "Stick and Sweet Tour" foi muito mais vazio.


Tudo isso é bastante estranho. Claro que nada poderia ser perfeito, mas imaginar um show de Madonna vazio (mesmo considerando exageros) é difícil. Quem passou pelo sofrimento da compra do ingresso não espareva menos que uma apocalypse para a primeira quinzena de dezembro, prova de que talvez a cantora não seja tudo isso que pensamos. Ela é diva e não deusa. Por azar nosso, aqui no Brasil, qualquer um pode ser uma estrela superior. Se não falar português, então, melhor ainda.



Com certeza, fico mais feliz com meu ingresso para ver o Radiohead em março do ano que não vai demorar a chegar. Mas aí já é outra história...

Foto: UOL

(Só para não esquecer: depois quero comentar tardiamente o ocorrido em Santa Catarina. Show de Madonna e Copa do Mundo não podem esconder a cruel realidade).

sábado, 13 de dezembro de 2008

E eles não devolveram o Bahia




Futebol, para mim, sempre foi um campo minado, metáfora explicada não só pelo meu leve desconhecimento sobre o assunto como também pelo perigo político que ele pode representar. Mas quando este se envolve com a política, sinto-me mais segura para falar alguma coisa. Da mesma forma que donos de empresas de comunicação não deveriam ser parlamentares, membros de diretorias futebolísticas também não.


Mas vamos ao que interessa. Marcelo Guimarães Filho*, deputado federal e cria do corrupto Marcelo Guimarães, ex-presidente do Esporte Clube Bahia, foi eleito o novo presidente do clube. Se da eleição participassem os torcedores, Marcelinho (como é chamado) não assumiria o posto. Nada melhor, para a corja, do que excluir o povo do processo político. É assim que se dá o continuísmo da corrupção e da politicagem em qualquer instância.


Coitados dos torcedores da Bahia. Ainda terão que engolir Paulo Carneiro. Digo "engolir" porque esse lobo transvestido de lã era da diretoria do Vitória (clube rival do tricolor) e não aprontou poucas por lá. Não esperam nenhum tipo de mudança, renovação ou melhora.


É por isso que futebol é, acima de tudo, perda de tempo. Paixão ? Tudo bem, mas paixão é algo que nos tem que dar orgulho, não? E nenhum torcedor baiano está em condições de estar apaixonado. Futebol é sinônimo de desavença, corrupção e, mais recentemente, morte. Posso estar sendo chata demais por levantar a bandeira anti-futebol, mas é que aproveito o meu desapreço por esse esporte para fazer as devidas críticas. Mas existem lá suas vantagens. Futebol é válvula de escape para os brasileiros. É uma ótima maneira de controle social através da cultura.


* Marcelinho, em outros tempos, foi coringa político de Antônio Carlos Magalhães, que precisava derrotar o seu então inimigo político, Benito Gama. Recebeu todo o apoio do ex-coronel baiano para sair vitorioso, e assim o fez.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

A volta dos que nunca foram




Acabei de ler uma notícia que, se não é de toda empolgante, ao menos deixa os fãs de rock mais felizes. O Kiss, banda que se consagrou por ter sido uma bem sucedida convergência entre rock e pirotecnia, anunciou que entrará em estúdio para gravar um disco de inéditas. Em 2009, o grupo completa 35 anos de uma carreira cheia de lacunas, altos e baixos.


Apesar de estarmos falando de uma das maiores bandas de rock que já existiu - não só pelo som, como também pelo caráter fenomenal - não é de se esperar um disco de qualidade. Exemplos como o lendário Chinese Democracy são exceções, em meio aos discos lançados por ícones da música que resolvem ressuscitar. O tempo do Kiss é o passado. Desde que Peter Criss e Ace Frehley, baterista e guitarrista originais, respectivamente, saíram da banda, já não se tinha rock and roll all night and party every day. Até que Gene Simmons e Paul Stanley tentaram manter-se no auge, tirando a pasta d'água do rosto e dando nova cara à banda, mas de nada adiantou. Nessa época, saíram bons singles como "Lick It Up", mas nem chegou perto da magia de "Detroit Rock City", por exemplo. O Kiss não era só uma banda que tocava rock; o espetáculo era algo inerente, o diferencial que tornou-os tão interessante.


É sempre válido esperar com certa ansiedade disco de inéditas daquela que foi uma grande banda. Mas o heavy metal que o Kiss fazia, creio eu, não encontra correspondência no presente, podendo o resultado desse novo trabalho ser constrangedor. Ao menos a turnê, que não se sabe se rodará o mundo, é garantia de qualidade. Vamos aguardar.
Na foto, Paul Stanley, guitarrista e membro fundador do Kiss. Jamais saiu do quarteto e será o produtor do próximo disco de inéditas.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Vamos bailar


Baile Esquema Novo, festa que tem sido a melhor do cenário alternativo baiano. Creio que gostaria ainda mais se os djs, com maior frequência, intercalassem em meio às obras-primas-sambas de Chico e a funk-samba-soul de Jorge, músicas mais populares e/ou modernas. Sinto falta de mais clássicos do Youtube e de som de carro, de eletrônica casada com a bossa e etceteras que estão desvinculados de qualquer conversadorismo.

Se eu fosse dj, tocaria tudo isso, fechando o set com "Acelerou", do Calypso.