sábado, 31 de maio de 2008

Duas Caras


Hoje vai ao ar o último capítulo de uma das novelas mais perigosas da Rede Globo, Duas Caras. Agnaldo Silva, esquerdista ressentido e autor da trama, deixou transparecer todas as suas mágoas com o lado vermelho da vida, através de personagens que exaltavam o totalitarismo social e perpetuavam, mesmo nas camadas menos favorecidas, o pensamento de uma elite burguesa e direitista.
Chegava a ser cômico (para não dizer trágico) o modo como certas ideologias eram sutilmente transmitidas. Desde a defesa explícita do ensino superior privado em detrimento do público, passando pela ridicularização dos movimentos sociais, até a má-caracterização do professorado como profissionais torpes, a trama, nesse sentido, beirava o absurdo.
Obviamente, não é a primeira vez que uma novela trata os temas reais de maneira irresponsável. Aliás, todas as novelas da Rede Globo não têm o menor escrúpulo ao abordar os assuntos da sociedade sob a ótica de quem a domina, ou seja, a minoria que está no topo da pirâmide. O problema é que os telespectadores desse tipo de programa fazem parte da grande massa que acaba impregnada de valores que a alienam à reflexão.
A diferença entre Duas Caras e as outras novelas é a nitidez ideológica e posição política de quem a escreveu.
Diversos exemplos poderiam ser aqui relatados, mas limito-me a apresentar apenas um; o mais grotesco, talvez. Um rapaz chamado Rodolf*, interpretado por um ator negro de traços brancos (pele morena-clara e, pasmem, olhos verdes) representava a classe média, universitária, esquerdista e, guardadas as devidas proporções, revolucionária. Não é preciso dizer que os diálogos e a interpretação era caricaturais, ridículas. Certo tempo se passou e uma garota, representante da chamada burguesia intelectualizada, desmascarou o rapaz que, na verdade, era muito rico e, segundo evidência na trama, um baderneiro sem ideal. No final, ele reconheceu que sua postura combativa era um “erro”, juntando-se à tal burguesinha que, segundo falas da mãe da garota, ajudou-o a deixar de ser um revolucionário tosco, passando a ser uma pessoa melhor. Sem mais comentários a essa tamanha falta de respeito a quem tem a esperança como virtude.
Bem, sobre a favela mais lunática e sem-cabimento da história da humanidade, a Portelinha, vou apenas comentar que é uma pena o desconhecimento das pessoas sobre a favela. Ficam à mercê de gente que não sabe do lado comunitário e complacente desses lugares. Como um autor pode chegar tão perto da realidade e, ao mesmo tempo, distanciar-se tanto dela? Esqueçam Juvenal Antena, aquilo é um delírio inclassificável.
Sei que novelas, não necessariamente, são correspondentes ao real. Mas precisamos admitir que a maioria das pessoas pensa que sim e, inclusive, baseia seu comportamento nos valores ali ditados.
Sem mais.
*Rodolf – Não sei, sinceramente, se é assim que se escreve e, confesso, estou sem saco para procurar o resumo dos capítulos e sanar minha dúvida.

4 comentários:

Gilvan Reis. disse...

Rudolf!

E essa é a novela mais bizarra que a Rede Globo já transmitiu. De um pobreza de diálogos mais acentuada do que o comum. E a leitura de mundo e de Brasil que ele, o autor, tem é rasteira pra caramba!

bjo

Glauber Farias disse...

1) de sutil aquilo nao tinha nada; era ridiculamente escancarado, parecia malhação, haha.

2) e novela nao tem obrigaçao nenhuma de educar nem de formar valores de ninguem.

Gilvan Reis. disse...

Ninguém tá falando que a novela tem obrigação de educar nem de formar valores, quem dera se elas nunca fizessem isso. O problema é que elas fazem. E quando fazem não conseguem dar espaço pra pluralidade, sempre silenciando ou debochando de quem pensa diferente. E aí está o problema.

Reny disse...

"Sei que novelas, não necessariamente, são correspondentes ao real. Mas precisamos admitir que a maioria das pessoas pensa que sim e, inclusive, baseia seu comportamento nos valores ali ditados."

Não tem uma obrigação de educar, mas elas sabem o poder que têm sobre o imaginário e a moral popular. É uma questão de responsabilidade.